Allana Katiussya Silva Pereira
Elias Costa de Souza
Engenheiros florestais, mestres em Ciências Florestais e doutorandos em Recursos Florestais – Universidade de São Paulo (USP)
Ananias Francisco Dias Júnior
Engenheiro florestal, doutor em Recursos Florestais pela e professor – Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
A vida moderna está ligada a muitas comodidades e à produção em massa de uma variedade de produtos, tendo como uma das consequências o aumento do volume de materiais desperdiçados no mundo.
Dentre eles, os resíduos sólidos de origem urbana têm sido encarados como um dos principais problemas da gestão ambiental de muitas cidades. Essa preocupação se justifica devido à sua produção desenfreada e pela falta de soluções sanitárias e ambientais adequadas à sua disposição final e/ou reaproveitamento.
A Política Nacional dos Resíduos Sólidos (PNRS), por meio da Lei 12.305 de 2010, trouxe instrumentos importantes ao correto manejo de resíduos sólidos em todo o Brasil. Por meio de 15 objetivos, a PNRS visa estimular um novo olhar para esses materiais, de modo a possibilitar alternativas viáveis de reuso, reciclagem e a escolha por matérias-primas cujo ciclo de vida permita menor impacto no meio ambiente.
Dessa forma, essa Lei tem permitido a busca pelo desenvolvimento de sistemas de gestão ambiental pautados na melhoria de processos, produtos e no reaproveitamento de resíduos.
Dentre esses resíduos sólidos, um merece destaque: o resíduo madeireiro. Trata-se todo material lenhoso que é descartado após tratos silviculturais, atividades de colheita florestal, transformações industriais da madeira, resquícios de árvores atacadas por agentes xilófagos, galhos e troncos oriundos de podas urbanas e até mesmo madeiras de árvores acometidas por catástrofes como raios e enchentes.
Para onde vão os resíduos madeireiros urbanos?
No Brasil, dados do Ministério do Meio Ambiente estimam que sejam gerados anualmente cerca de 30 milhões de toneladas de resíduos de madeira, cuja principal destinação final ainda está concentrada em aterros sanitários e na queima ao ar livre, configurando um grande problema ambiental e desperdício de matéria-prima que poderia ser utilizada para gerar diversos produtos.
Móveis danificados, restos de madeira de construção civil e de árvores são um dos principais resíduos madeireiros que ocupam grandes extensões em aterros sanitários. O peso e o volume desse tipo de material, além das questões tecnológicas envolvidas, são obstáculos ao processamento e reuso dos resíduos madeireiros.
Dessa forma, são necessárias alternativas que viabilizem o seu reaproveitamento como forma de reduzir a quantidade que é gerada e destinada aos aterros sanitários e à queima direta. Uma dessas formas de valorização de resíduos madeireiros urbanos pode ser pela fabricação de brinquedos.
A transformação
Os brinquedos atuais têm apresentado plástico na maior parte da sua composição. Nesse contexto, os resíduos madeireiros ganham ainda mais importância, principalmente devido às urgências recentes em reduzir o uso de materiais não renováveis e de difícil decomposição na natureza. Trata-se de uma matéria-prima que pode atribuir resistência, durabilidade, estética e sustentabilidade aos brinquedos.
No entanto, quando se fala em resíduos madeireiros, falamos também dos desafios do seu manejo: são materiais com propriedades físicas e químicas heterogêneas e, muitas vezes, desconhecidas.
Dessa forma, o primeiro passo para transformar um resíduo de madeira em um produto de valor agregado é conhecer as suas características. Isso é feito por meio de estudos que permitam avaliar as propriedades tecnológicas (físicas, químicas e mecânicas) dos resíduos, bem como o correto armazenamento e secagem do material.
Porém, ainda há poucos estudos que avaliem espécies potenciais à fabricação de brinquedos e a viabilidade econômica da produção, além de orientações bem definidas sobre a coleta, preparo e processamento de resíduos de madeira para essa finalidade.
Há carência, ainda, de informações sobre as composições químicas desses resíduos e a interação de diferentes tintas com a madeira. Além disso, pesquisas que abordem o nível de aceitação desses brinquedos por adultos e crianças devem ser introduzidas a fim de direcionar os melhores caminhos à fabricação de brinquedos funcionais ao desenvolvimento de crianças de diferentes faixas etárias.
Benefícios de reaproveitar resíduos madeireiros
De maneira prática, além dos benefícios ambientais ligados ao reaproveitamento dos resíduos madeireiros na produção de brinquedos, podem ser notados benefícios diretos na economia e na sociedade.
Um resíduo deve passar por uma linha de produção para adquirir valor agregado e, consequentemente, se tornar um produto. Com resíduos madeireiros e brinquedos acontece da mesma forma.
Após a fabricação, o que antes se tratava de um material sem valor e que gerava danos ambientais, os brinquedos podem a ser valorizados e vendidos, retornando ganhos financeiros onde antes existiam apenas gastos para o seu descarte.
Além disso, por ser um material de fácil acesso, os brinquedos produzidos a partir da madeira residual podem ser vendidos em valores inferiores aos brinquedos de madeiras de marcas já difundidas em grande escala.
Essa oportunidade de produzir brinquedos com valores mais acessíveis às diferentes camadas da sociedade pode impactar diretamente no desenvolvimento de crianças que, por questões financeiras, não poderiam adquirir brinquedos de grandes marcas, auxiliando diretamente no desenvolvimento intelectual e motor dessas crianças de diferentes faixas etárias, por meio do uso de brinquedos de madeira.
Fontes geradoras de grandes quantidades de resíduos madeireiros, como as cidades, pela arborização urbana, podem criar parcerias com empresas interessadas na produção de brinquedos e, por concessões e acordos, realizar doações às crianças e comunidades em situação de vulnerabilidade.
Dessa forma, os benefícios econômicos, sociais e ambientais podem ser alcançados de maneira eficiente e justa, contribuindo para o desenvolvimento sustentável de comunidades no Brasil e no mundo.